A pandemia da Covid-19 alterou sensivelmente a rotina e dinâmica da nossa sociedade. Pessoas e serviços foram surpreendidos com a necessidade do distanciamento social e isso nos conduz a uma reavaliação dos espaços físicos das edificações e a organização das cidades.
Mesmo sem a pandemia, as cidades já estavam se transformando para uma nova organização, principalmente em função das tecnologias de informação e comunicação, como a internet de alta velocidade, internet das coisas, big data (análise de grandes volumes de dados), robôs autônomos, realidade virtual etc.
Pesquisas apontam que, neste ano, cerca de 50 bilhões de aparelhos eletrônicos estão conectados na internet, entre smartphones, computadores ou, quem sabe, sua geladeira. São mais que seis vezes a população mundial.
O Japão lançou em 2017 o conceito da sociedade 5.0 para o futuro, centrada no homem e que se baseia no uso da tecnologia para a melhoria da qualidade de vida das pessoas. Nessa sociedade nos libertaremos do automóvel, teremos máquinas e sensores operando e monitorando nosso meio ambiente, lar e saúde para uma vida melhor. Nesse momento de confinamento, pessoas e empresas estão reavaliando seu modo de viver, trabalhar e operar. O conceito da sociedade 5.0, aliado à pandemia global, conduziu-me, como arquiteto e professor, a reavaliar e imaginar algumas mudanças.
O trabalho e ensino a distância estão sendo colocados à prova nesse momento, porém muitas pessoas e empresas vão perceber que isso é viável e vantajoso.
Posso imaginar que, nossos lares vão abrigar um espaço físico de trabalho, ditos home-offices, hoje opcionais, mas que no futuro farão parte dos layouts das moradias, com acessos independentes e possibilidade de receber clientes. Talvez apareçam nas moradias espaços dedicados e separados de outros aposentos, para o estudo à distância, com crianças e adultos tendo aulas por teleconferência.
A legislação urbana será alterada de forma a permitir o uso misto das edificações em todos os zoneamentos, como edifícios multifuncionais — que abrigam moradia, trabalho, comércio e outros serviços em um mesmo edifício. Empresas irão reestruturar sua organização, permitindo o trabalho em casa e assim reduzirão seus custos.
Podemos imaginar também que, por meio do monitoramento por sensores e reuniões à distância, faremos consultas médicas sem sair de nossos lares, em um sistema de saúde mais econômico ao usuário e com mais abrangência. Remédios, assim como qualquer tipo de produto, serão entregues por drones, sem a necessidade do contato físico.
Com as pessoas trabalhando e estudando em casa, aliviaremos o tráfego de carros e transporte coletivo nas cidades. O uso da inteligência artificial permitirá que ônibus, táxis e outros transportes possam ser feitos sem motoristas, evitando possíveis contágios.
Alguns eventos, que até então seriam presenciais, como cinemas, shows, concertos, poderão ser realizados de modo virtual. O uso da realidade virtual e mista, tornará comum a realização de espetáculos e apresentações à distância, com a imersão e interação em ambientes virtuais. Assistiremos shows no conforto de nossos lares, com óculos 3D e som de alta qualidade, em uma experiência que poderá ser melhor que a presencial.
Obviamente são apenas conjecturas, mas devemos estar preparados para as mudanças. Penso também que mesmo camadas da população mais pobres terão acesso a essas tecnologias, como hoje têm aos smartphones, e teremos assim maior inclusão social — um dos pilares da sociedade 5.0.
Não será a última pandemia, porém que ela sirva para repensar nossa sociedade. Só não nos esqueçamos de não perder a humanidade.
Autor: Norimar Ferraro é arquiteto e urbanista, mestre em Educação e professor da pós-graduação em Arquitetura 4.0 do Centro Universitário Internacional Uninter.